segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Pré-sal e a política gasífera nacional

Edmar Luiz Fagundes de Almeida, D.Sc.
Grupo de Economia da Energia
Instituto de Economia, UFRJ

As descobertas do Pré-sal despertaram discussões políticas e acadêmicas muito acaloradas sobre possíveis mudanças no arcabouço regulatório e institucional do setor e sobre o que fazer com o grande volume de óleo a ser produzido. Entretanto, ainda não surgiu no debate uma discussão sobre o gás natural do Pré-sal. Como sempre, o gás natural é esquecido, visto por todos como o “primo pobre” do milionário petróleo. Entretanto, se tiver muito óleo no Pré-sal, certamente tem muito gás natural também. Confirmada esta premissa, o gás natural poderá ser matéria de importantes decisões de política energética, e ocupará a um grande espaço na agenda de discussões no setor energético brasileiro.

O mercado de gás natural no Brasil vem passando por um período de forte turbulência em função da falta de uma oferta doméstica adequada e da nossa dependência do fornecimento Boliviano. A rápida expansão da demanda nos últimos anos resultou numa escassez de oferta. A política gasífera nacional vem passando por profundas transformações, em função da necessidade de arbitrar as prioridades para o uso do gás natural. Por um lado, o governo elegeu o setor elétrico como consumo prioritário; por outro lado, permitiu à Petrobras adotar uma política de forte elevação de preços para desestimular o crescimento do consumo nos outros segmentos. Esta política gasífera representou uma forte inflexão na estratégia de desenvolvimento do setor que, desde a inauguração do gasoduto Bolívia-Brasil, praticou preços relativamente baixos, buscando estimular a demanda para “encher” do gasoduto. Esta mudança radical na política de preços tem conseqüências negativas para a competitividade da cadeia de gás natural e dos setores industriais gás intensivos.

A descoberta do pré-sal descortina uma nova realidade no que tange o potencial de oferta de gás natural no Brasil. A possibilidade de abundância de gás pode representar uma grande oportunidade para uma nova política gasífera que busque disponibilizar para o país grande quantidade de energia a preços competitivos. O gás natural tem o potencial para se tornar um fator importante de industrialização e desenvolvimento. Vários segmentos industriais - tais como cerâmica, química, papel e celulose, siderurgia, metalurgia, entre outros - podem ter na oferta de gás natural relativamente barato um fator de competitividade internacional e atração de investimentos. Diante disto, é fundamental incorporar o gás natural no debate sobre o futuro do Pré-sal.

Enquanto por um lado o governo já se mostra preocupado em não exportar petróleo bruto, e prega a necessidade de investimento em refinarias, já se cogita investir na liquefação de gás natural embarcada na bacia de Santos, inclusive visando a exportação. Esta assimetria é um sinal claro da falta de uma visão estratégica mais ampla no setor de energia nacional. Do ponto de vista da industrialização, é muito mais interessante favorecer a oferta do gás natural a baixo preço para a indústria nacional que gastar bilhões em refinarias que, além de gerar poucos empregos, tem uma viabilidade econômica duvidosa.

Uma nova política de gás natural num contexto de grande potencial de oferta deveria se pautar pelas seguintes premissas:

  1. O mercado doméstico e, em particular o setor industrial, deveria ser prioritário para o aproveitamento e valorização das reservas de gás nacionais;
  2. Enquanto o petróleo deve ser considerado uma commodity internacional e precificado levando em conta o mercado mundial, o gás natural deveria ser considerado um insumo estratégico para o país;
  3. É necessário estabelecer uma política de preços que leve em conta custo de produção, transporte e distribuição, incluindo obviamente uma remuneração adequada para os investidores.

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